Este é um texto sobre comparação.

Uma coisa que vem me pegando muito nesses últimos dias, são as redes sociais, simplesmente por comparação. Ok, é fato que padrões sempre existiram, mas o que acontece hoje vai além da estética. É simplesmente um estilo de vida. Já pararam pra pensar o que seria “lifestyle” em um mundo onde o que mais tem são realidades diferentes?

Cada vez que o celular recebe a notificação do tempo de uso em aplicativos é como se saísse o resultado de uma premiação. Menos tempo significa que talvez estejamos produzindo mais e fazendo algo de útil, mas, quando o tempo de uso aumenta nos martirizamos até o fim do dia com perguntas como: “será que eu só consumi a vida alheia e não fiz nada por mim?”.  E isso é absurdamente cruel para pessoas que possuem uma rotina sem tempo pra respirar algumas vezes.

Se olharmos por uma perspectiva diferente, conseguimos perceber que 90% do que vemos nas redes são os bons momentos das pessoas. Mesmo os ruins, continuam sendo meticulosamente articulados para serem tristes, mas não tanto ao ponto de gerar algo grandioso,  apenas um consolo para quem está assistindo. E percebi que às vezes, é exatamente isso que eu mesma faço. Cada palavra colocada em textos são planejadas: nada nunca é escrito por acaso. Mas eu acredito que seja mais pela armadura que criamos sobre quem de fato somos. O famoso: se você esconder suas fraquezas e vulnerabilidades em um ritmo constante ao ponto de se tornar normal, pode ser que elas sumam por repetição. Piada.

A identidade cultural na pós-modernidade do escritor Stuart Hall é um daqueles livros que são necessários por dizer o óbvio que ainda não foi verbalizado, ou que a gente esquece. Ao trazer todo o caminho que a identidade do ser humano percorreu até chegar aqui e ser percebida como instável, ele nos faz questionar sobre a quantidade de sujeitos que criamos dentro de nós para nos encaixarmos em diferentes situações da nossa vida. O que pode te dar dois caminhos: ou você entra em colapso por entender que talvez nunca descubra quem você é de verdade, ou simplesmente aceita e vê o quão enigmática é a percepção de que todas as suas versões são você: além do trabalho, além da família, além dos amigos. Um compilado de experiências vividas que ainda guardam espaço para as que estão, por que não?, predestinadas a acontecer e que têm sim a ciência de que podem ser facilmente destruídas e odiadas. E tá tudo bem. Esse é o processo.

Um processo de uma modernidade líquida o suficiente para se importar mais com o ser, do que com o ter. Talvez se aceitássemos a liquidez de uma sociedade, conseguíssemos vê-la de um jeito diferente. Algo que não é sólido, tem o poder de ser mutável. E ao ser mutável, te dá milhões de possibilidades. Heráclito já dizia isso no momento em que percebeu que nem ele, nem o rio, eram os mesmos quando ele se banhava pela segunda vez, mas ninguém se importou tanto com isso. Tudo possui uma dualidade: ter relações rápidas e não concretas, é o lado obscuro. Mas poder conhecer alguém e compreender a capacidade de que tanto você quanto ela podem errar e mudar, talvez seja a luz no túnel das desesperanças.

E esse é o motivo do porque tudo isso afeta tanto. Ao consumirmos o “ficcional baseado em fatos reais” queremos tanto ser aquela pessoa, quanto ter o que ela tem, é simplesmente almejar o que é não é palpável: a rotina, a força de vontade, a criatividade.

Eu sei que corri o risco de bater numa mesma tecla infinita vezes já teclada escrevendo esse texto. Mas também sei que é necessário repetir o banal. Não quer dizer que a partir de agora vou viver no mundo das maravilhas nas redes sociais. Mas vou tentar me machucar menos ao ver uma foto linda, editada, tratada e principalmente, planejada para estar ali.

Espero que se você tenha se identificado, possa fazer o mesmo.