Pessoas com Transtorno do Espectro Autista (TEA) enfrentam desafios diários em uma sociedade que, muitas vezes, ainda não compreende plenamente suas necessidades. No Brasil, estima-se que cerca de 2 milhões de pessoas tenham o diagnóstico, segundo a Organização Mundial da Saúde (OMS) e estudos da Universidade de São Paulo (USP).
Apesar do número expressivo, o sistema da Polícia Civil não contabiliza separadamente os casos envolvendo vítimas com TEA. A ausência dessa categorização impede o acesso a dados precisos sobre quantas dessas pessoas já sofreram algum tipo de agressão.
Segundo a psicóloga Samira Mafioletti Macarini Frizon, da Delegacia de Proteção à Criança, ao Adolescente, à Mulher e ao Idoso (Dpcami) de Criciúma, há registros de atendimentos envolvendo pessoas autistas, mas eles não são reconhecidos de forma oficial. “A gente sabe que acontece, porque vemos nos atendimentos, mas os números simplesmente não aparecem”, afirma.

Ela relata que há casos em que crianças autistas foram agredidas por adultos incapazes de lidar com os comportamentos específicos do transtorno. “Essas crianças têm reações diferentes, exigem mais paciência, mais cuidado”, explica. Segundo Samira, quando as pessoas ao redor não compreendem essas particularidades, podem reagir de forma violenta.
Entre os casos atendidos, Samira cita o de um adolescente autista exposto a conteúdos pornográficos enviados pelo próprio pai. Os pais do menino são separados. Durante uma visita à casa da mãe, o adolescente esqueceu o celular. Ao manusear o aparelho, a mãe encontrou diversos vídeos de conteúdo sexual, encaminhados pelo pai. “Foi uma situação grave. Além do conteúdo impróprio, há também uma suspeita de abuso sexual”, relata. Um boletim de ocorrência foi registrado, e a Justiça determinou medida protetiva contra o pai.
Apoio especializado
Diante de situações como essa, o Navit (Núcleo de Atendimento a Vítimas de Crimes) tem se mostrado uma ferramenta importante de apoio. O projeto, articulado por órgãos como o Ministério Público, oferece suporte psicológico, jurídico e social a vítimas de violência e seus familiares.
Em Criciúma, o núcleo funciona junto à Dpcami e busca humanizar o acolhimento de pessoas em situação de vulnerabilidade, incluindo crianças, mulheres, idosos e pessoas com deficiência. Para o psicólogo Gabriel da Silva, que atua no acompanhamento terapêutico de pessoas neurodivergentes, o acolhimento efetivo exige mais do que boa vontade institucional.
“Quando falamos em rede de apoio, ainda há lacunas importantes. Falta integração entre os serviços, capacitação contínua dos profissionais e, sobretudo, sensibilidade. A pessoa com TEA não pode ser reduzida a um diagnóstico. Ela é um sujeito com história, festas e vivências, e que merece ser reconhecida”, destaca.
Se você foi vítima ou conhece alguém que precisa de ajuda, entre em contato com o Navit pelo telefone (48) 3330-9534 ou pelo e-mail navit@mpsc.mp.br.

Reportagem escrita pelas acadêmicas do curso de Jornalismo da UniSatc, Ana Laura Galdino e Letícia De Brida, sob a orientação do professor Filipe Gabriel.